quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Uma palavra chorava

Uma palavra chorava
por lhe tirarem o cê
fica mais pobre o projeto
e o arquiteto ficou mais simples
a olhar pro teto
a ver ir o pê
mudo como sempre
com ótimo aspeto.
E perentório tirou
o chapéu a um dos irmãos
como leem, veem
e de voo contente
o erre por ter mais atenção
de autorregozijo viu
segunda e janeiro
perderem estatuto
como santo e até senhor.
Que desorientação:
com ene pequeno o norte lá está
seja como for
para uns discreto
para outros deceção
vingaram-se no inverno
diminuiram o verão.
Mas o hifen caladinho
ali a um cantinho
porque ainda fica
por aí para confundir,
há de vingar-se da desfeita
e gerar confusão:
cor-de-rosa sim
mas de burro a fugir não?
E o acento esquecido
já não dá confusão nem erro
afinal como é?
começámos a aula
ou começamos...

jm, 19 janeiro 2011

terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Ode antiga

Conta histórias, meu amor, lindas
enquanto argênteo pente
desliza nos teus auricritinos.

Não fales de projectos.
Sintamos, e pouco, somente
leves e passageiros afectos.

Saboreia o pão e o vinho
e não deposites a prazo,
frui a sombra do caminho

que o futuro incerto é.
Nem olhemos que o tempo foge:
sintamos a vontade do perto;

o longe repudiemos.
Colhe flores, amor, embeleza a hora
com as flores mais daninhas

e perfumemos este instante
invejado pelos deuses
a quem o Tempo também lho nega.

JM 82

terça-feira, 11 de janeiro de 2011

Romance dos (o)fendidos

Era uma vez um povo embarcado
com viúvas e órfãos e cornudos a rodos
que saiu do rectângulo
com o trangulo mangulo
a descobrir e educar povos!

Finda a empreitada,
sentaram-se à sombra da obra
e das ferramentas já ferrugentas
carcomidas e roubadas ao tempo,
mas sempre a palrar no passado
como o gabarola de Esopo.

Vós que de humano o gesto tendes,
gretado o peito e empedernido
de tantas ofensas e sacrilégios
por dentro e por fora fendido
já por farpões arregimentados
livrai-vos de qualquer jeito
antes que sejais fundidos
totalmente,e incluídos no lote
dos romeiros indesejados.

Lá vai um destemido
com fúria grande e sonorosa
de pau ufano e feito
à procura da cicuta, em vão,
que socraticamente livrará
a nação desse ignavo sono
e grita-se em mole
como se acreditassem
num qualquer miserando encoberto!

Os mais velhos esgueiram um olhar
gasto e quase baço;
os assim assim ainda dardejam,
à socapa, como mastins acossados
por créditos a perder de vista;
os mais novos seguem indiferentes
de calças pendentes
de fones e tudo.
Os restantes, os eleitos,
arremessam as siglas mais brutais
com indiferença tal
que tanto se lhes dá que haja FMI,
BCE ou não,UE - Portugal!

JM - janeiro 2011